UMA SEMANA COM ROSSI:
DIÁRIO DE UM JORNALISTA ENFIADO NUMA VISITA PASTORAL
Acompanhar uma visita pastoral de Dom Agnelo Rossi é como cobrir um comício onde o orador esqueceu o texto e resolveu improvisar com a alma — e com a raiva. Ele não tem papas na língua, não tem paciência com o clericalismo e não traz no bolso a diplomacia vaticana. Rossi, ao contrário, carrega o cheiro das fábricas, o peso dos injustiçados e a irritação com padres mornos.
E o pior: Ele foi direto ao ponto: ou a Igreja muda, ou ela se torna irrelevante. E, por mais que ele fizesse isso sem uma fórmula mágica ou discurso rebuscado, ele foi eficaz. A coluna esteve com ele em todos os pontos da rota. Abaixo, relatos sem filtro, como os gestos do arcebispo.
1. SANTUÁRIO EUCARÍSTICO DE SÃO SEBASTIÃO
– ONDE A VISITA VIROU TERAPIA COLETIVA
Primeiro, a visita começou no Santuário de São Sebastião, um lugar onde, teoricamente, o clima deveria ser de oração. Mas, como já era de se esperar, Rossi trocou o ambiente sacro por um palco de terapia coletiva. O frei Francisco Manzana, com um sorriso de quem achava que o arcebispo vinha apenas para abençoar o povo, mal sabia que receberia uma das maiores lições de história de sua vida. O tema? Barbacena. Aquelas lobotomias. O Holocausto Brasileiro. “A Igreja se esqueceu de agir enquanto o povo apodrecia em silêncio”, bradou Rossi, de maneira incisiva, apontando os erros de uma Igreja que, por muito tempo, foi conivente com as maiores barbáries do país.
“Precisamos ser voz, precisamos agir.”
A reação foi imediata: as senhoras com seus terços abaixaram os olhos, os padres se olharam como se quisessem fugir da sala. Mas uma senhora, sentindo talvez um cheiro de verdade nas palavras de Rossi, sussurrou: “Esse bispo é estranho, mas eu gosto dele”. E o Cravo anotava tudo, tentando digerir o choque enquanto o povo começava a refletir sobre a verdadeira missão da Igreja. Não era mais sobre decoração do altar, mas sobre levar a palavra para quem realmente precisa ouvir.
2. PARÓQUIA NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS
– A VÍTIMA DA NOITE FOI UM PADRE

“Quero um vigário geral ativo. Não um simples gestor de eventos litúrgicos, mas alguém que se envolva com o povo, que dialogue com a vida real.”
A frase parecia simples, mas foi como um soco no estômago de todos os presentes. Os bispos-auxiliares engoliram seco, e um padre sussurrou para o outro: “Mas será que ele não viu que estamos tentando fazer o melhor dentro das nossas condições?” Sim, padre, ele viu. E não gostou.
3. PARÓQUIA DO CARMO
– O DIÁCONO VIROU SANTO
Depois, uma passagem pela Paróquia do Carmo trouxe uma mudança curiosa de tom. O diácono Guilherme, ao contrário dos outros padres, já tinha sua chance de brilhar. Vendo o trabalho árduo do jovem, que montou um tríduo sozinho, Rossi não poupou elogios.

“Isso é o que chamo de Igreja de verdade. Aqui, o trabalho se faz com dedicação!”
A reação da multidão foi imediata: o diácono, que até então era apenas mais um entre os servos da paróquia, agora está sendo aclamado como um futuro santo. E, como qualquer pessoa com um mínimo de percepção, o Cravo aqui já notava que esse garoto tinha algo que os padres da alta cúria de São Paulo não tinham: coragem.
4. CATEDRAL METROPOLITANA
– LUXO DEMAIS PRA UMA IGREJA QUE FALTA NO INTERIOR
A Sé, imponente. O arcebispo, impaciente. Enquanto turistas tentavam selfies com os vitrais, Rossi fazia contas mentais:
“Enquanto a Sé reluz, tem capela no Jabaquara com goteira.”
A impressão era clara: Rossi queria fazer da Catedral um galpão de escuta sinodal. Mas ela parece, para ele, mais museu do que templo. E talvez ele esteja certo. Seu foco estava no povo que, ao contrário dos padres, não tinha tempo para igrejas de mármore. O povo queria uma Igreja de ação, não de luxo.
5. IGREJA DE SANTO ANDRÉ
– FIM COM ORAÇÃO E UM SÍNODO

“Falamos demais para Deus e ouvimos de menos o povo. O sínodo está chegando. E ele não vai ser mais uma reunião entre quatro paredes.”
Se alguém tinha dúvida sobre o que Rossi pretendia, essa frase deixou tudo claro: ele estava preparando o terreno para algo muito maior. O sínodo é, na sua mente, não só uma reunião entre padres, mas uma revolução nas bases da Igreja.
O bispo auxiliar engasgou com a água. Padres anotavam no caderno, com cara de quem viu a tempestade no horizonte. A visita acabou, mas o efeito dela está só começando.
ENTRE A BENÇÃO E A BRONCA:
O POVO, O COMÉRCIO E OS COMENTÁRIOS
Nas portas das igrejas, promoções discretas: terço da promoção, escapulário de R$ 20,00, Bíblia ilustrada com santo e time do coração. O povo não economizava nas opiniões:

“Tá certo ele. O outro só aparecia em foto.”
E o Cravo aqui pensa: e se o sínodo de Rossi realmente acontecer? E se ele reunir o povo, escutar as bases e propor uma revolução pastoral?
Ou vai mudar tudo... ou vai cair feito falso profeta.
_______________________________
EDITORIAL DO CRAVO:
ENTRE A CÚRIA E O CAOS, UM BISPO IMPREVISÍVEL
Dom Agnelo Rossi é franciscano. É rude, direto, cortante. Não quer tapete vermelho. Quer chão batido e povo falando. Se for santo, será santo de suor, não de milagre. Se errar, errará com a coragem de quem tentou mudar.
A Arquidiocese já ganhou quatro bispos auxiliares em poucas semanas — parece contramedida da Cúria Romana pra conter esse “cardeal de chinelo”. E ele? Ele segue. Sem disfarce. Sem báculo. Sem script.
Ele tem o apoio do povo, mas sua relação com o clero é tensa e com Roma, indefinida. Uma coisa é certa: ele não vai se acanhar. O arcebispo já deixou claro que não será mais um simples espectador da história da Igreja. Ele vai entrar nela com toda a força de seu caráter, com sua brutal sinceridade e sem receio de enfrentar os poderes estabelecidos. Se é para sacudir a Igreja, ele está pronto para ser o tremor.
Mas, ao mesmo tempo, sabe que o relógio está correndo. E Roma observa.